sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Bom Dia, Verônica – Andrea Killmore

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“Forcei um sorriso, concordando com ele. Mais do que um soco, o velho merecia umas porradas. Machista de merda. Eu sabia quanto era difícil para qualquer mulher vir até uma delegacia prestar queixa, ter que vencer a vergonha e explicar como foi feita de trouxa por um galã que lhe fez juras de amor via internet. Só pensava em como Marta tinha se sentido ao ser recebida por Carvana, aquele tom depreciativo na voz, aquele desprezo pela dor que ela sentia. Eu entendia por que a pobre coitada tinha pulado da janela.”

Andrea Killmore

Eu não estava no clima para algo perturbador, mas meu lado curioso por mistérios sempre vence meu lado cansado que quer pensamentos felizes.

“Bom dia, Verônica” é um livro cheio de coisas a se comentar. A primeira delas é que a editora Darkside não está para brincadeira. Eles costumam caprichar na parte estética das edições para ganhar os leitores, além de ter estratégias interessantes pela internet. Só que nesse livro eles foram além.

Acredito que para compensar o fato de que os leitores de thrillers não se interessariam por uma edição nacional da categoria, eles trouxeram a “questão” da autora. Está na contracapa e nas páginas da internet:

“Quanto menos você souber sobre Andrea Killmore, menos risco vai correr. Amiga íntima do perigo, a nova autora da Darkside Books é uma revelação que não se pode revelar, e seu verdadeiro nome continua um mistério até para a editora. Em outra vida, ela foi alguém importante dentro da polícia. Após trabalhar infiltrada em um caso e sofrer uma grande perda pessoal, a autora se viu obrigada a assumir uma nova identidade. E com ela, uma nova vocação...”

Apesar de todo esse mambo jambo de anonimato, fiquei curioso justamente com o contrário. Como seria um suspense policial brasileiro? Fiquei com medo de ser algo que iria para o lado de Tropa de Elite ou qualquer obra do cinema brasileiro, mas fiquei surpreso com a forma, com a linguagem e, sobretudo, com a escrita da autora.

A protagonista do livro se chama Verônica, uma escrivã de polícia que por conta de problemas no passado, ficou relegada a um cargo puramente burocrático, sendo secretária de um delegado na DHPP.

Logo no início vemos a insatisfação com a vida sem significado que Verônica tem, daí até o título do livro, já que todos na delegacia lhe dão bom dia, mas ninguém liga para ela.

O problema é que no mesmo dia Verônica acaba testemunhando um suicídio dentro da própria delegacia e também recebe uma ligação de uma mulher desesperada pedindo ajuda.

Mesmo sendo fora de sua função e mesmo dissuadida pelo seu chefe, Verônica investiga os dois crimes e vai ao longo da obra descobrindo situações terríveis que afastam cada vez mais um possível fim de acordo com a Justiça, pelo menos a formal.

O livro é muito bom e eu li em poucos dias, até por não ser longo e enrolado também. Verônica é uma personagem muito interessante, porque faz parte dessa nova geração de protagonistas não idealizadas, com problemas reais e dilemas verossímeis.

Aliás, o que mais me dava um pé atrás com “Bom dia, Verônica” era a questão da verossimilhança, porque se a autora tentasse imitar o estilo gringo de escrever romances de investigação utilizando o Brasil como localização, ficaria impossível. Esse país é próprio.

Foi nessa parte que eu achei excelente a escrita de Andrea Killmore. É bem fiel a algo que se espera da realidade paulistana, com até o senso de humor dos brasileiros.

“Quando terminamos, ajeitei-me bela, recatada e do lar, e paguei o serviço com uma gorjeta generosa. Não sei se estava na classificação da Helô, mas o frentista, sem dúvida, era um cafuçu long neck: a embalagem não era lá essas coisas, mas o resto...”

A parte que não gostei tanto foi o excesso de situações incomuns e violentas que foram colocadas para chocar. A autora parece que descarregou toda a sua munição de uma vez, ficando difícil de acreditar nessa coincidência de coisas assombrosas acontecendo com uma pessoa só. Mas tudo bem, é ficção.

Posso ser chato e ver um errinho de português aqui e outro ali? Sim. Posso ter visto alguma confusão quanto à revisão sobre nosso sistema legal? Também, mas não é o mais importante.

bom dia veronica

Observo também que essa obra foi escrita muito recentemente, porque Verônica pega Uber e no livro há várias referências e expressões que aconteceram no Brasil há muito pouco tempo. A linguagem certamente pode unir as pessoas e nisso houve um grande acerto.

A autora até ensaia algumas reflexões legais, aquelas passagens que a gente marca no livro porque achou interessantes:

 

 

 

“O ser humano é podre e egoísta, prefere o problema que já conhece a enfrentar o desconhecido com honra. Janete não tinha coragem de se livrar do marido criminoso, mas tinha coragem de me entregar para ele a fim de ser torturada. Em seu egocentrismo insano, era uma mulher disposta a tudo para manter a vidinha torpe”

O final do livro é complicado. Não gostei muito da direção que a personagem Verônica tomou e como as histórias se encerraram. Mas apesar de não ser do meu gosto, não critico, porque fez sentido.

De todo modo, como romance de estreia, “Bom dia, Verônica” não fez feio, porque não há muito disso por aqui e há espaço para crescimento. Achei divertido e em alguns momentos desacreditava no que lia, de tão absurdo.

Foi um acerto e recomendo aos entusiastas desse tipo de literatura.

FDL

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

La La Land: Cantando as Estações

la la landFilme: La La Land: Cantando as Estações (La La Land)
Nota: 7,5
Elenco: Ryan Gosling, Emma Stone, J.K. Simmons, participação do John Legend
Ano: 2016
Direção: Damien Chazelle

 

 

 

É o filme do momento. Tava com grandes expectativas, porque é só elogios. Ganhou todos os prêmios importantes no Globo de Ouro, como melhor atriz, ator, diretor e filme.

Foi recorde também de indicações ao Oscar.

Eu sabia que era um musical, com ares de retrô e um filme romântico. Nada disso é algo que me interessa. Mas já me surpreendi muito com filmes fora do meu gosto que foram excelentes. Qualidade independe de gênero.

As cenas iniciais, tanto no engarrafamento, quanto da Mia com as amigas e as cenas do começo com Sebastian são consideradas geniais pelos críticos. Não achei graça nenhuma, nem vi nada demais.

Claro que há músicas, coreografias, deve ter dado um trabalho da porra de filmar e tal, mas aquilo não me diz nada.

Aliás, boa parte dos números musicais não me dizem nada. A cena inicial do romance dos dois, quando estão na provocação inicial, é chata e aquela música insuportável. Os dois começam a sapatear no meio da rua. Tudo bem que é um musical, mas não vi contexto.

A história em si trata da atriz Mia que luta para ter um papel e do músico de jazz Sebastian, que luta para pagar suas contas trabalhando em algo que o faça feliz, ou seja, o “puro” jazz que está em decadência.

Ambos se aproximam e agora aparecem os elogios: é bonita a história de amor que não é somente algo sexual ou açucarado, eles são importantes um para os outros porque se ajudam a realizar os próprios sonhos, ainda que aos tropeços.

Não é que eu não goste de musicais, alguns são muito bons. Mas as cenas do começo do filme não fizeram sentido para mim. Tem uma passagem que eles vão dançando, vão para as estrelas, o céu e tudo. Não só não entendi como achei bem brega aquilo tudo.

Só que eu entendo o frenesi todo. La La Land tem toda uma estética diferenciada, com luzes e cores originais e atores que são bem queridinhos dos amantes do cinema. Eu também gosto deles.

O problema é que para mim não teve essa identificação toda não.

O fato é que o filme melhora do meio para o final. A cena final é muito bonita, quando Mia está no bar e assiste Sebastian tocando. Vale pelo filme.

A música City of Stars fica na cabeça. Quando você repara, sai cantarolando ou assoviando a musiquinha do Ryan Gosling.

Eu recomendo. Fãs de musicais, coreografias, figurinos e coisas do tipo deverão amar. Eu sou mais da mensagem, da atuação, da história.

FDL

sábado, 21 de janeiro de 2017

Procurando Dory

procurando doryFilme: Procurando Dory (Finding Dory)
Nota: 8
Elenco: Ellen DeGeneres, Ed O'Neill, Ty Burrell, Diane Keaton, Idris Elba, Kate McKinnon, Bill Hader, Sigourney Weaver
Ano: 2016
Direção: Andrew Stanton, Angus MacLane

 

 

 

As continuações da Pixar levam vários anos para ficarem prontas e eu gosto disso, porque significa que há cuidado, não são feitas de qualquer jeito. Há sempre muito detalhe nas produções deles.

Procurando Nemo é uma excelente animação, mas já não é mais das minhas preferidas. Não bateu aquela nostalgia toda como com Toy Story 3.

Só que é um desenho (sou velho, ainda vou chamar de desenho e pronto) muito interessante, com valores muito caros passados às crianças, sobretudo com a personagem Dory. Por isso o filme dela.

Ainda que haja as cenas de humor infantil e toda a beleza gráfica, que são muito importantes, a ideia de que Dory é a melhor. Mesmo tendo um grave transtorno de memória, ela não perde a esperança de sair dos problemas, de fazer amigos, ajudar os outros e ser feliz.

Assisti com o áudio original em inglês e é muito melhor. A voz de Ellen DeGeneres deixa a personagem muito mais interessante.

Não é o filme que mais marca, com certeza não está no top 10 da Disney, mas é agradável e eu recomendo.

FDL

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

O Dilema

o dilema

“Então assim que são os litígios, pensou Samantha. Talvez ela começasse a compreender. Essa era a onda, a euforia, o narcótico que levava os advogados de tribunal à beira da loucura. Essa era a emoção que Donovan procurava quando se recusou a fazer um acordo. Essa era a overdose de testosterona que inspirava homens como seu pai a correr o mundo procurando a quem processar”.

O Dilema – John Grisham

Não tem começo de ano sem ler mais um livro do John Grisham. Tá virando especial do Roberto Carlos.

O Dilema foi lançado no Brasil em 2015. O original chama-se Gray Mountain e é de 2014.

Esse livro conta a história de Samantha, uma jovem advogada com poucos anos de carreira que trabalha em um gigante escritório em New York, com uma função enfadonha de revisar contratos imobiliários.

No entanto, a crise dos imóveis pega sua empresa e, para não ser demitida, ela recebe uma proposta: trabalhar pro bono em uma ONG por um ano e não perder seus benefícios de empregada, com a possibilidade de a crise passar nesse tempo e ela recuperar seu emprego.

Com uma vida dedicada praticamente por completo ao escritório, Samantha fica sem chão e resolve conhecer a ONG, que fica na cidade de Brady, na Virgínia, região dos Apalaches.

A história do livro é essa transformação de Samantha, que conhece uma ONG apenas com advogadas mulheres que atendem gratuitamente a população pobre, que é massacrada por grandes corporações e um poder público omisso.

Além disso, Samantha conhece o advogado Donovan, que luta sozinho contra a exploração dos trabalhadores e do meio ambiente cometido pelas grandes empresas do carvão, que detonam tudo em busca de lucros.

A beleza da história está num acordar de Samantha para uma advocacia que faz sentido, que realmente traz a paz para quem precisa, mesmo que às custas de muito sofrimento e perigo.

Esse livro me lembrou um pouco um dos primeiros do John Grisham que eu li, O Advogado.

A história é interessante e o livro tem pouca barriga, com exceção de algumas longas passagens com informações específicas sobre a extração do carvão nos Apalaches.

Com certeza é mais uma homenagem de John Grisham à profissão do advogado, que pode ser muito odiado por alguns, mas tem sua função essencial em uma sociedade sadia.

A escrita de Grisham só melhora. Além disso, ele sabe explorar os perfis típicos de americanos, principalmente influenciados pela regionalidade. Isso faz a obra ficar mais rica.

Destaco um trecho interessante do livro, num diálogo entre duas mulheres, uma mais experiente e outra incipiente nos dramas da vida:

“Dizem que uma mulher se casa com um homem acreditando que pode muda-lo, e ela não consegue. Um homem se casa com uma mulher acreditando que ela não mudará, e ela muda. Nós mudamos.”

Recomendo esse livro. Não é o melhor nem o pior, mas demonstra uma fase inspirada do autor.

FDL

domingo, 15 de janeiro de 2017

Animais Fantásticos e Onde Habitam

Animais FantásticosFilme: Animais Fantásticos e Onde Habitam (Fantastic Beasts And Where To Find Them)
Nota: 9
Elenco: Eddie Redmayne, Colin Farrell, Ezra Miller, Jon Voight, Johnny Depp
Ano: 2016
Direção: David Yates

 

 

 

Harry Potter voltou. Quando se trata da indústria cinematográfica, nunca diremos adeus a nada. Sempre há os spin offs e os reboots.

Sou bastante admirador das histórias de Harry Potter e o mundo criado por J. K. Rowling. Li tudo enquanto era adolescente e acompanhava os lançamentos dos livros e filmes com ansiedade, vendo todos no cinema.

Fiquei com sérias reservas quanto a esse filme, mesmo tendo sido escrito pela autora e dirigido pelo mesmo cara dos últimos filmes. Sempre surge a suspeita de ser só mais uma produção para tirar dinheiro dos fãs saudosos.

Me surpreendi. Já começaram escalando o Eddie Redmayne para o protagonista Newt. Esse ator é muito bom, você se identifica com os personagens dele logo na hora em que eles aparecem.

O resto do elenco também é impecável, com direito a uma aparição surpresa do Johnny Depp no final.

Gostei muito do filme, que possui aquele bom humor típico das histórias de J. K., com uma visão muito agradável de assistir do mundo dos bruxos.

Vai ter trocentas continuações, mas me pegou e vou ver sim. Não é Harry Potter, mas consegue matar a saudade.

Recomendo.

FDL

sábado, 14 de janeiro de 2017

A Garota No Trem

the girl on the trainFilme: A Garota no Trem (The Girl On The Train)
Nota: 8
Elenco: Emily Blunt, Rebecca Ferguson, Justin Theroux, Luke Evans. Participação de Laura Prepon, Allison Janney e Lisa Kudrow
Ano: 2016
Direção: Tate Taylor

 

 

 

Li o livro A Garota No Trem em 2015 e fiquei ansioso aguardando como seria o filme que já teve os direitos reservados logo da publicação do sucesso editorial.

No post que fiz sobre o livro, comentei sobre a sinopse, que é bem fiel na comparação. Também comentei que embora seja uma história de crime e suspense, tem uma mensagem no plano, que é a do abuso contra a mulher. As três mulheres e narradoras sofrem um tipo de abuso.

O filme é bom, mas não é espetacular.

Em primeiro lugar, não tenho nada contra a Emily Blunt, aliás, a acho uma excelente atriz. Apenas não concordo com a escolha dela para interpretar a personagem Rachel. Ela é retratada por escrito como acima do peso e chega a causar repugnância. Não é o caso da Emily Blunt com certeza.

Qual o problema em escalar uma atriz gorda? Nem quando é para viver uma personagem problemática e com a autoestima jogada ao chão dão uma oportunidade a uma atriz gorda? Entendo, não vende. Só que não é real também. Considero isso um defeito grave desse filme.

Fora isso, não há muitas diferenças entre as histórias, mas há claramente uma dificuldade em aprofundar o conhecimento que temos sobre essas personagens. Isso já imaginava que seria complicado, pois o livro é inteiro escrito na forma de diários. Como seria feito um filme assim?

Era desafio do diretor Tate Taylor, que já tinha feito um excelente trabalho com Histórias Cruzadas, mas aqui conseguiu apenas ir bem.

É complicado comparar livros com filmes, mas poderiam ser explorados aspectos que o cinema favorece, como uma boa trilha sonora ou a oportunidade de vermos interpretações bem inspiradas.

Até a atriz Allison Janney não foi bem explorada, como a policial Riley, que é bem importante no livro.

Assim até parece que o filme é uma porcaria. Não é. É um ótimo filme, que nos prende e deixa curiosos, mas tudo isso graças a uma boa história lançada anteriormente. Vi defeitos e quis ser específico em apontar quais eram.

Com certeza recomendo, porque esse é o meu tipo preferido de suspense: personagens interessantes e complexos, uma dose criminal, uma reflexão de fundo e um mistério que nos instiga.

FDL

domingo, 8 de janeiro de 2017

Florence Foster Jenkins

florence fosterFilme: Florence Foster Jenkins
Nota: 9,5
Elenco: Meryl Streep, Hugh Grant, Simon Helberg (o Howard, de Big Bang!), Rebecca Ferguson, Nina Arianda
Ano: 2016
Direção: Stephen Frears

 

 

 

 

Esse é um excelente diretor. Seus filmes sempre estão entre os indicados ao Oscar por algum motivo. Entre eles está um dos meus favoritos de todos os tempos, Ligações Perigosas.

Também é dele um clássico dos anos 90, Alta Fidelidade. Aliás, preciso rever esses dois filmes, com uma cabeça mais de velho.

“Florence Foster Jenkins (Meryl Streep) é uma rica herdeira que persegue obsessivamente uma carreira de cantora de ópera. Aos seus ouvidos, sua voz é linda, mas para todos os outros é absurdamente horrível. O ator St. Clair Bayfield (Hugh Grant), seu companheiro, tenta protegê-la de todas as formas da dura verdade, mas um concerto público coloca toda a farsa em risco.”

Florence Foster é uma personagem adorável. É uma rica excêntrica, mas dá vontade de ser amigo dela, sem ser por interesse. A relação dela com St. Clair é muito bonita e mostra um tipo diferente de amor, que não estamos acostumados a ver.

Filmes com a Meryl Streep sempre são uma garantia de personagens complexos e diferentes. Essa mulher é impressionante em tudo que faz. O Hugh Grant também estava muito bem em seu personagem.

Agora, atores bons quando surgem não há dúvidas. Esses dias, quando comentava Goliath, a série da Amazon, elogiei a atriz Nina Arianda. Olha lá ela de novo, com uma ótima personagem, bem no estilo de uma atriz diferente mesmo.

Trata-se de um filme adorável. Estava precisando disso.

Recomendo bastante.

FDL

sábado, 7 de janeiro de 2017

Cercas

cercasFilme: Cercas (Fences)
Nota: 8,5
Elenco: Denzel Washington, Viola Davis
Ano: 2016
Direção: Denzel Washington

 

 

 

 

 

Começou a temporada de prêmios. Geralmente é uma ótima época para bons filmes e uma grande expectativa para quem vai ganhar.

Comecei com esse porque era o disponível, não há muitos pela internet ainda.

Obviamente que o nome da Viola Davis já chama a atenção. Na minha humilde opinião, é a melhor atriz do mundo.

O filme é bem pesado e conta a história de um homem que trabalha como recolhedor em caminhão de lixo e a forma como ele lida com sua família nos anos 50.

O personagem Troy Maxson é bem complexo. Ele fala muito, o tempo inteiro, chega a cansar a quantidade de palavras. É uma forma que ele tem de fazer com que todo mundo o compreendesse, mesmo que nem mesmo ele conseguisse fazer o mesmo.

A relação do homem com seus filhos é complicada, ele vem de um passado turbulento, de violência do pai, abandono, prisão e uma promissora carreira esportiva que acabou não dando certo.

Esse filme fala muito de racismo, mas acima de tudo, fala de família.

É um drama típico, que sabemos muito bem como vai se desenvolver, mas sofremos assistindo, de forma tensa. Esse homem é uma bomba-relógio e as relações dele são todas movidas por uma violência contida.

Gostei e recomendo. Não vi os outros filmes ainda, mas a Viola Davis é espetacular sempre.

FDL

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

S. – Doug Dorst e J.J. Abrams

“E ali, diferente de em sua cabine, ali ele não sente divisão entre mente e mão, nenhum erro de tradução ou estática na transmissão: as palavras que aparecem na página são aquelas que ele pretendia colocar, as imagens correspondem às cenas em sua mente, as sensações são exatamente aquelas que aquecem seu peito, arrepiam seu couro cabeludo, empurram os olhos.

O que o faz perder a noção do seu entorno? Será o prazer primevo da expressão? A dor de seus ferimentos? Os efeitos de simultaneamente verter sua vida para o papel e em uma poça carmim a seus pés? A euforia que vem com essas sensações de seu passado (o aroma doce e reconfortante do bolo de sua mãe no forno, o azedo das frutas vermelhas em sua língua, os toques de cardamomo e canela, a riqueza da manteiga; o rosto de seu pai, com os olhos pesados, nariz torto e sorriso sonolento; surtos de riso abafado de seus irmãos e irmãs aninhados para se proteger das correntes de ar gelado que correm pelo apartamento) rompe a represa que as continua e corre por sua mente, suas terminações nervosas, suas veias, seu coração? Talvez tudo isso. Algumas respostas são pouco.”

Doug Dorst, J.J. Abrams

s jj abrams

O final de 2016 e começo de 2017 com certeza foi marcado por esse livro. Aliás eu me corrijo dizendo que S. é mais do que isso. É uma experiência literária e filosófica.

Vou primeiro colocar a sinopse oficial:

“Uma jovem encontra numa biblioteca um livro com anotações de um estranho. As margens repletas de observações revelam um leitor inebriado pela história e pelo misterioso autor da obra. Ela responde os comentários e devolve o livro, que o estranho volta a pegar. Ele é Eric, ela é Jennifer, e o inesperado diálogo dos dois os faz mergulhar no desconhecido. É esse velho exemplar típico de biblioteca - consultado, anotado, manuseado - intitulado "O Navio de Teseu", de V. M. Straka, que o leitor encontrará dentro da caixa preta e selada de "S.".

A lombada está visivelmente gasta e as páginas, amareladas, rabiscadas com comentários manuscritos em diversas cores. Entre as folhas, surpreendentemente, há cartas, cartões-postais, recortes de jornal, fotografias e até um mapa desenhado em um guardanapo. "O Navio de Teseu" data de 1949 e é o décimo nono e último romance de Straka, autor cuja vida é um mistério. Nem mesmo F. X. Caldeira, responsável pela tradução da obra e pela publicação do derradeiro livro, já após o desaparecimento e a suposta morte de Straka, tem mais informações.

Nas notas de rodapé, Caldeira tenta contextualizar e relacionar as obras e a vida do autor. Nas anotações a lápis e a caneta, porém, vê-se que Eric, um estudioso de Straka, parece não concordar com as notas da tradução. E as observações escritas por Jennifer, uma graduanda cheia de segredos que trabalha na biblioteca da universidade, mostram que ela percebeu isso. Da conversa entre Jennifer e Eric nas margens das páginas da obra emerge uma nova trama, que levará os dois a enfrentar decisões cruciais sobre quem são de verdade, quem talvez venham a se tornar e, ainda mais importante: quanto de suas paixões, mágoas e medos eles estariam dispostos a compartilhar com alguém que não conhecem.”

Ler o livro é um desafio. Você já começa tomando cuidado para não derrubar os diversos papéis avulsos anexados nele. Depois, você precisa se decidir se lê primeiro o livro e depois as anotações e anexos ou lê tudo de uma vez. Minha opção foi fazer separado. Pesquisei sobre isso e aparentemente não há um jeito certo de ler.

Aliás, meu modesto intelecto me exigiu pesquisar informações sobre S. após a conclusão da leitura, já que algumas arestas passaram despercebidas por mim.

O livro “O Navio de Teseu” conta a história de um homem desmemoriado que busca saber quem é e também luta por um propósito na vida além de sobreviver aos perigos que sofre constantemente.

A história é complicada de ler. É cheia de simbolismos e tem uma linha narrativa e temporal distinta, distorcida. Em boa parte da história o personagem S está dentro de um navio fazendo questionamentos e identificando observações que podem ter significados.

Esse título remete ao que se conhece como paradoxo do navio de Teseu. Resumidamente, vem da mitologia grega na história do homem chamado Teseu que derrotou o Minotauro e voltou para casa em um navio em uma viagem que levou anos. Várias partes deste navio foram sendo trocadas ao longo do tempo, levando à seguinte dúvida: com essas peças substituídas trata-se do mesmo navio ou é um navio novo? O que define essa identidade, as peças sobrepostas ou o significado que elas possuem ali?

Isso se reflete no livro em diversas partes, pois com novas experiências, S. já é outra pessoa ou é a mesma antes de perder a memória? Embora ele não soubesse quem era, sua essência seria a mesma se ele soubesse?

Nesse ponto preciso ressaltar que é uma obra do J.J. Abrams, mesmo que ele seja mais um autor mentor do que quem de fato escreveu a obra, que foi Doug Dorst. O que importa é o seguinte: J.J. Abrams é fascinado por mistérios, mas não é chegado em revela-los. Ele vive dizendo que as perguntas são mais importantes que as respostas.

Não fui um grande entusiasta de Lost, mas reconheci diversas qualidades dessa série. Realmente esse espírito de investigar aquilo que nos deixa curioso é muito viciante. E para isso a história contada deve ser boa e bem escrita, senão a curiosidade não aparece.

Após ler o livro principal, voltei às primeiras páginas e comecei a ler as anotações nas laterais do texto e os anexos entre as folhas. Para isso, é necessário reler vários trechos de O Navio de Teseu.

Aí o negócio pegou.

Os personagens Jen e Eric vão lendo a história, investigando o plano de fundo e nos dando informações “do mundo real”, além de narrar o que vão descobrindo.

Ele é um estudante da obra de Straka e se envolveu em problemas por conta de seu trabalho. Todos os estudiosos do autor lutam para descobrir a identidade dele, que aparentemente morreu há décadas.

A leitura desses diálogos é bem desafiadora. A ordem cronológica e lógica dos assuntos e acontecimentos é complicada de acompanhar. Sabemos que conforme as cores das canetas utilizadas por eles mudam, a cronologia muda também, significando que eles retornaram à página para adicionar novas palavras. Ainda assim, os assuntos são misturados.

Além disso, não sei se pela falta de espaço ou para sintetizar o assunto, diversos personagens são descritos com poucas informações, mas tão poucas que somos obrigados a decorar nomes ou escrever em um papel para não esquecer.

Mas com esforço a gente consegue seguir na história e junto com eles sabemos de descobertas acerca do possível nome verdadeiro do autor e sobre o que aconteceu, além de detalhes polêmicos sobre sua vida e de quem o cercou. Não bastando isso, temos a própria história de Jen e Eric, que compartilham suas histórias, seus problemas e acabam enfrentando tensões ao cavucarem uma trama que por muitos anos esteve oculta.

Tudo fez sentido? Para mim não. Algumas coisas ficaram no ar.

Como já disse antes, fiz algumas pesquisas na internet e depois reli algumas partes, percebendo que na riqueza de detalhes, alguns fragmentos não fixaram e eu precisava deles para a montagem da história, que fez muito mais sentido.

Não fosse só isso, acabei descobrindo que os autores e a editora lançaram diversos conteúdos pela internet, até criando sites, contas no Youtube e blogs com diversas informações adicionais sobre o livro.

Evidentemente é um livro que não acaba nunca, porque sinto que se relê-lo vou descobrir mais coisas, vou fazer novos questionamentos e compreender mais simbolismos.

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Agora, como experiência de leitura não preciso falar nada, é excepcionalmente criativo e instigante, valendo a pena por si só. E quanto ao conteúdo?

Também tem qualidades. Observamos que O Navio de Teseu já retrata o questionamento da identidade e o significado dela, como um paralelo ao paradoxo que já comentei. Além disso, o livro tem correspectividades com a suposta história do autor, que lutou contra as injustiças do capitalismo, se levantando contra empresas que exploravam a mão-de-obra e a natureza de forma selvagem.

Algumas respostas ficam no ar, outras ficam na desconfiança, mas uma muito importante é dada. O que motiva todos os personagens a seguirem nessas viagens, seja nos barcos reais, seja nos figurados não é só a busca pelo autoconhecimento: é o amor.

S. ao final acaba sendo uma história de amor também, tanto entre os leitores quanto entre os personagens de O Navio de Teseu, quanto, por fim, na história descoberta de V.M. Straka.

O trecho que selecionei para epigrafar esse post é bem interessante para mim, porque é o escritor no mundo da fantasia, idealizando o sonho de todos que escrevem: a retratação por palavras de forma precisa do que se pensa e sente. Impossível, mas não no mundo da literatura.

Confesso que em alguns momentos a gente se entedia com o excesso de simbolismos, que chegam a romper a lógica do texto. Além disso, tem enrolação em algumas partes sim. Nada é perfeito.

Mas soube que essa história levou anos para ficar pronta, o acabamento físico desse livro é impressionantemente atencioso e uma obra como essa é impossível de ver por aí durante muito tempo.

Para mim, valeu como experiência de leitura, como novidade, como um convite a questionamentos e, como não, como história de amor.

Recomendo.

FDL

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Top 10: A televisão de 2016

Vi menos séries nesse ano, por uma questão de tempo e também por não estar tão empolgado assim com as críticas. Muita coisa recebia uma porrada de elogios, mas quando você ia lá ver nem era isso tudo.

Mesmo assim as séries fazem parte da vida de todo mundo agora e vejo de verdade jovens e velhos se revoltando contra a péssima qualidade da tv aberta e indo assistir ao que quer, não o que a grande mídia impõe goela abaixo.

Netflix, HBO e a tv americana como um todo são os melhores. Infelizmente nada na televisão brasileira esse ano me chamou a atenção. Quem sabe no próximo.

Eis:

1 - House of Cards: 4ª Temporada

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A série do David Fincher humilhou todas as outras esse ano. Aliás, pela lista vemos que o Netflix como um todo está de parabéns.

Kevin Spacey e Robin Wright fizeram um trabalho impecável em uma temporada que sacodiu a série por inteiro e deixou uma porta para algo que não sei como vai acontecer.

Não tem pra ninguém. 2016 foi o ano de House Of Cards.

2 - How To Get Away With Murder – 2ª Temporada

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O trabalho de Viola Davis continua insuperável e ela é a melhor atriz do mundo. Não discuto isso. Mas a segunda temporada não foi tão boa quanto a primeira. Ainda foi excelente e viciante, não poupo elogios. Mas não segurou o primeiro lugar de 2015.

Aliás, preciso ressaltar que essa série é um exemplo de que a tv aberta americana não está perdida não.

3 - Series Finale: The Good Wife

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Pena que acabou. Às vezes eu criticava essa série, mas agora que começaram as novas temporadas eu percebo como sinto falta desse universo. Infelizmente essa série teve problemas durante toda a exibição, mas isso não apagou sua genialidade.

Não foi o final de série que eu esperava, mas sempre vou lembrar da série que já foi a minha preferida várias vezes.

4 - American Crime Story – The People v. O.J. Simpson

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Não sou o maior fã de Ryan Murphy, mas ele foi preciso ao retratar essa história real ocorrida no início dos anos 90. A atenção da mídia era tão intensa que não se sabia mais o que era real ou espetáculo, o que era notícia ou o que era entretenimento mórbido.

Excelentes atuações da Sarah Paulson e do Cuba Gooding Jr. Mereceu todos os prêmios que ganhou.

5 - Veep – 5ª Temporada

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Finalmente Veep entrou na lista. Mas essa temporada foi acima da média. Julia Louis-Dreyfus é um gênio da comédia. O elenco de apoio é muito bom.

Essa série é irônica e debochada. Gosto muito dela e nunca perco.

6 - And Then There Were None

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Um dos meus livros preferidos e teve uma versão em minissérie em 2016. Foi excelente e é impressionante como toda a obra da Agatha Christie é viciante.

7 - Goliath – 1ª Temporada

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Ficou para o finalzinho do ano, mas jamais posso deixar David E. Kelley de lado. É outra pessoa iluminada pela inspiração em escrever. No caso dele é o mundo do direito, que é tão podre e fascinante ao mesmo tempo.

É um drama típico, mas com excelentes diálogos e atuações

8 - Love – 1ª Temporada

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É aquele tipo de comédia romântica moderninha, que tem feito sucesso. Gosto desse estilo e essa série foi uma agradável surpresa da Netflix no começo do ano.

9 - Making a Murderer

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Documentário em série do Netflix que acabei vendo em janeiro. É um excelente e incômodo relato de um caso que deveria fazer o mundo todo parar e repensar o direito penal.

10 - The Night Of

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Uma excelente história do HBO que tratou de um sistema policial viciado e de um sistema prisional cheio de problemas. Gostei do enfoque mais psicológico que essa série deu ao mundo do crime como um todo, explorando acusados, promotores, advogados, policiais e o sistema de uma forma geral.

Destaco também a temporada final de Rizzoli and Isles, que vai deixar saudades. A temporada de Saturday Night Live também foi excelente.

No final do ano também tivemos a boa segunda temporada de Secrets and Lies.

O resto, vemos essas comédias porque faz falta rir, vemos alguns dramas por comodidade. Quem sabe dá para mudar isso com boas novas atrações?

Confesso que meu problema esse ano foi falta de tempo, porque várias séries passaram e eu me interessei, mas simplesmente não dá mais para ver tudo.

Que venha 2017 ainda melhor que um bom ano para as séries.

FDL