segunda-feira, 10 de março de 2008

Justiceiros

Hoje eu vi uma coisa que realmente me fez pensar. E como o blog é um excelente meio de não só mostrar, mas também registrar as opiniões, mereceu um post.

Primeiro um resumo do que aconteceu:
Assisti um episódio de Cold Case, aquela série que reabre casos de homicídios antigos que não foram solucionados. É interessante por causa da tecnologia e da mudança de comportamentos.
O episódio de hoje chama-se Justice e é bem emblemático e polêmico esse nome. Vou explicar, não parem de ler.


Foi reaberto um caso de 1982 depois de o túmulo de um homem jovem assassinado ser pichado com o nome "estuprador". Com as investigações descobriu-se que ele era um aluno de faculdade perfeito: orador da turma, ajudava em caridade, bonito e muito bem sucedido com as mulheres.
Pois bem, depois disso descobrimos que ele saía com as meninas do campus e ía ao quarto delas. Apesar de elas dizerem não, de fato ele as estuprava.
Depois de descobrirem umas as outras, elas planejaram fazer justiça com as próprias mãos.
Uma policial que recebeu denúncia de algumas delas afirma que o sistema na época era machista e incapaz de ajudá-las e que não pôde fazer nada, pois embora injusta, era a lei. No entanto depois descobrimos que essa policial não lavou as mãos, arrumou "por fora" uma arma para uma das garotas para que se ele voltasse ela o matasse, alegando legítima defesa, o que faria com que ela não fosse presa. Diz ela que fez isso pois não podia ver a menina ser desfavorecida pelo sistema que na hora h dizia que o estupro ocorreu porque a mulher provocou, afinal, elas os deixavam entrar no quarto.

Os investigadores de Cold Case começam a ver o canalha que era a vítima e começam a desistir de levar a investigação de homicídio a diante, parecia ser algo bom matar o estuprador.
No final, descobrimos que embora as meninas tenham planejado o matar, elas não tiveram coragem, ou simplesmente não acharam certo. Quem o fez foi o irmão mais novo de uma delas, que ouviu o estupro e quis proteger a irmã. Na época o menino tinha 12 anos.

No momento do interrogatório, a detetive Rush (foto) começa a induzir o menino (agora adulto) a dizer que o estuprador foi em direção dele, que estava assustado, enfim... forçando a fazer uma confissão falaciosa para que ele não fosse preso, houvesse legítima defesa, embora isso não tenha acontecido. De acordo com o flashback, o menino foi até lá para fazer justiça com as próprias mãos. Resultado, ele confirmou a mentira e não foi preso.

Agora sim eu chego onde eu queria: foi certo?

É claro que a situação caminha a um momento em que a gente fica completamente desconfortável em ver ser presa uma criança que cometeu um crime nessas circunstâncias, mas eu acho que foi um incentivo às pessoas serem justiceiras.

Embora:

1- Não houvesse legislação que protegesse as vítimas de estupro.
2- Era, de fato, uma criança assustada.
3- O morto tivesse cometido uma série de crimes hediondos.

O fato é que:

1- Quem somos nós para julgar que alguém deve morrer por causa de um crime que não está precrito? Inclusive em um país que admite a pena de morte é inconcebível isso.
2- Se alguém faz isso, deve ir à justiça comprovar que esse crime foi excusável, esconder isso só confirma que o crime aconteceu.
3- Existem outras formas de se chegar à Justiça, não é matando os outros que isso vai mudar.
4- Se alguém TIVESSE o direito de matar alguém justificadamente, com certeza não seria alguém de fora.
5- Me pareceu que a mensagem foi a seguinte: "A polícia/Justiça não foi capaz de te proteger? Faça você mesmo, matando de preferência!".
6- O dever da polícia é ir atrás de fatos, o que acontece depois não lhes diz respeito.
7- Não é uma questão de legalismo (do tipo: Tá na lei!), mas sim de proteção de interesses sociais, não individuais.

Eu ainda percebi uma falha no episódio: não houve procura pela família dele, que, com certeza iria se opor ao final que essa investigação teve, já que todos merecem um julgamento justo.

Não quero defender bandidos, mas acho que se as coisas caminham assim como a série encaminhou, nós iríamos em direção à barbárie. E olha que eu sou a favor de punições severas.

Como eu não me contento em criticar uma posição sem dar outra melhor, eu complemento. Se as meninas (ou quem zelava por seus interesses) não conseguiram que alguém acreditasse que elas não mereciam aquilo, que armassem um flagrante, que armassem uma confissão, que espalhassem o boato. Eu sei que não é fácil se abrir em uma situação dessa e até compreendo a vontade e o ato de matar, mas não posso concordar que quem faça isso saia em liberdade.

Resultado: eu acho que os policiais deveriam ter prendido o cara que matou o estuprador, com todos os atenuantes possíveis, mas sem inventar justificativas.
Acho que é isso.

FDL

3 comentários:

Fernanda disse...

vou refletir um pco sobre o assunto e já comento

Fernanda disse...

Vamos por partes...
A princípio é completamente compreensível a reação de susto de um menino de 12 anos ao se deparar com o estupro da irmã, porém, com 12 anos, este reflexo ser o de matar, já é algo um tanto quanto estranho.
O fato da detetive ter induzido a situação, para a absolvição do réu, é completamente fora de ética, além de acobertar um crime fica a impressão de "Ah! é um caso muito complexo...vamos deixar assim..."
Concordo que poderiam ter organizado um flagrante e concordo que ele deveria ser julgado com todos os atenuantes possíveis.

Mila disse...

eu entendo o crime como excusável. achoo que pode ser considerado legitima defesa, ele agiu em defesa de terceiro (no caso da irmã). acho sim que o cara tinha que ser absolvido, mas nao da forma como foi, e sim contando a real do que aconteceu. nao sou de forma alguma a favor da auto tutela, nao me interprete mal, apenas entendo que no momento da violencia deve-se, da maneira como for possível, conte-la. talvez matar o estrupador fuja um pouco da razoabilidade, mas o que um garoto de 12 anos poderia fazer?
nao conheço a legislação americana, mas o nosso Código Penal preve, em seu artigo 25 "Entende-se em legitima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem."
sendo assim, a única coisa que pode-se dizer da atitude do irmao da moça é que ele teve uma atitude desmedida, mas, insisto, tratava-se de uma criança de 12 anos, ele nao tinha outros meios de "segurar" um adulto.